segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

LUTO MATERNO

A morte de um filho é um evento difícil de aceitar, principalmente para a mãe. Normalmente, a morte de uma criança ou adulto jovem é uma experiência emocionalmente muito mais intensa do que a morte de um adulto. O luto pela morte de um filho, geralmente, é o mais intenso, pois a morte interrompe muitas expectativas e esperanças depositadas sobre ele, nas etapas subsequentes de sua vida. A dificuldade em aceitar este tipo de morte é porque ela promove uma interrupção, um corte em uma sequencia esperada, de forma irreversível
Nesse caso podemos perceber que a dor da mãe que perde um filho precocemente está próxima de ser uma das piores dores emocionais pela qual um ser humano pode passar.
Brown (1995, p. 402) descreve o impacto da morte de um adolescente para seus progenitores, nos seguintes termos:
O fato de que a maioria dos adolescentes morre subitamente, em resultado de um acidente ou por suicídio, aumenta ainda mais o grau de ruptura familiar. Os sintomas dessa ruptura familiar são muitas vezes duradouros, e variam da dissolução da família através de separação/divórcio à sintomatologia emocional, como depressão ou doença física, geralmente em outro filho adolescente.
Bromberg (2000) concorda com a afirmação acima, dizendo que a morte de um adolescente, que normalmente acontece por acidentes (comportamento de risco), suicídio, homicídio ou câncer, promove um agravante na vivencia do luto, pois pode provocar sentimentos conflitantes nos pais e irmãos, que buscam com avidez identificar uma razão para esta morte tão precoce de alguém já vinculado no sistema familiar. Neste sentido Brown (1995, p. 402) diz que “a doença grave ou morte de um adolescente pode ser considerada como o acréscimo de muito mais estresse/tumulto a uma fase já estressante da vida”.
Do ponto de vista do ciclo de vital, enquanto o membro idoso é visto como alguém que já completou sua vida, restando-lhe poucas tarefas e responsabilidades, o adolescente ou adulto jovem é visto como alguém que ainda tem muitas coisas para fazer na vida e, por isso, recebe uma carga maior de responsabilidade do sistema familiar. Quando ocorre uma fatalidade e sua vida é ceifada, nesta fase do ciclo vital, a família fica com a sensação de que sua vida foi incompleta, pois não seguiu o curso normal. Ela enxerga sua morte como um erro, algo que aconteceu fora do curso natural da vida. Esse tipo de luto é muito mais doloroso, principalmente para os progenitores.
 Brown (1995, p. 399) esclarece que: Tanto nas fases iniciais do ciclo de vida quanto nas finais, o indivíduo tem menos responsabilidades familiares essenciais. Assim, parece haver um período crítico de aproximadamente vinte anos em que, em iguais circunstâncias, a morte e a doença grave parecem provocar o maior impacto.
Bromberg (2000) diz que o impacto da morte de um adolescente ou adulto jovem, dentro do sistema familiar, ocorre pelo fato de que este é o momento de construção, de início de sua independência. Quando sua vida é abruptamente interrompida, nesta fase, provoca forte dificuldade nos sobreviventes em se adaptar às mudanças de uma experiência oposta ao curso normal da vida, dentro do ciclo vital.
Outro fator agravante que complica o processo de luto, principalmente dos progenitores, é a morte repentina de um filho.
Neste sentido, Kaplan et al. (1997) diz que “a morte súbita é mais traumática do que uma morte por doença prolongada, uma vez que nesta ultima pode ocorrer tristeza antecipatória”.
Kaplan et al. (1997) também concorda que as pessoas com maior risco de desenvolverem um luto patológico são aqueles que sofrem uma perda súbita, ou em circunstâncias terríveis. Elas se isolam do meio social e acreditam, de forma real ou imaginária, que foram responsáveis pela perda. A situação fica ainda mais grave quando estas pessoas enlutadas têm histórias anteriores de perdas traumáticas na família, ou mantinham um relacionamento ambivalente e/ou dependente com a pessoa falecida.
É por isso que Parkes, Holmes e Rahe (1967 citado por FREITAS, 2000, p. 42) advertem:
Os antecedentes históricos da mãe enlutada representam um importante papel na evolução de seu luto, no momento em que esta perde um filho. Perdas sofridas, doenças físicas e mentais prévias, história de depressão anterior e de eventos de vida estressantes são também indicadores de que o luto pode complicar-se. Pessoas que passaram por sérias crises anteriores terão maiores dificuldades no luto. Daí a importância de conhecer como essas crises anteriores repercutiram na vida dessas pessoas.
No início do luto, segundo Winsdom (1997 citado por FREITAS, 2000, p. 50), a tomada de uma providencia é importante para atenuar os efeitos da dor que a mãe sente por esta perda inesperada:
É fundamental que a mãe, nesses casos, receba do médico e da equipe que atendeu seu filho informações sobre o que ocorreu, as quais podem servir para encorajá-la a aceitar a morte. Há uma grande tendência a acusar o médico de negligência, ou a outras pessoas da equipe hospitalar. Assim, explicações minuciosas sobre a doença que vitimou o filho podem ajudar a minimizar tal problema.

A morte de um filho adolescente ou adulto jovem é uma tragédia para a mãe e produz intensa tristeza e pesar. Ela pode conservar dentro de si estes sentimentos por muito tempo, ou para sempre. Eles podem causar doenças e, inclusive, levar a mãe a óbito. Podem gerar, na mãe, um desejo irresistível de reunir-se com seu filho perdido; de sair da vida pela dificuldade de suportá-la. A morte do filho gera uma quebra no ciclo evolutivo. É difícil para a mãe aceitar que seu filho morra antes dela. A mãe enlutada tem dificuldade de encontrar uma razão maior que sua dor para continuar vivendo. Por isso, de acordo com Freitas (2000, p. 50), diante da morte de seu filho querido a mãe pode ter vários tipos de reações:
A mãe pode ficar confusa, perdida e culpada, mostrando desejos de morrer em seguida, para não precisar enfrentar essa realidade que se lhe impõe. Uma doença grave e repentina no filho adulto jovem é vivenciada como uma punição. [...] Sente-se solidão e um intenso sofrimento. Sofrimento indescritível, quando se trata de um filho. A mãe se questiona sobre o que fará sem seu filho. Foi muito esperado e acalentado. Havia sonhos e expectativas. E, após a morte, como lidar com tudo isso e, principalmente, com a solidão, com o vazio? É o que se costuma ouvir com mais frequência, ao longo da experiência clínica com mães enlutadas.
A mãe que perde um filho adulto jovem, normalmente demonstra um senso de irrealidade da perda. Essa descrença em relação à perda pode permanecer por um determinado período. Às vezes, a mãe só consegue acreditar na morte de seu filho com ajuda terapêutica. (FREITAS, 2000)
As consequências da morte de um filho na vida da mãe são muito graves. Por ser uma experiência desconcertante para a mãe, pode despertar nela algumas respostas à separação. Uma resposta comum durante o luto é a da procura pelo filho. Segundo Freitas (2000, p. 52), a mãe enlutada pode ficar atormentada pela idéia fixa que irá encontrar novamente seu filho que morreu.
Ela sabe que ele não está ali, junto dela, mas continua fazendo verdadeira peregrinação: vai até o quarto, ou a outros lugares onde ele poderia ser encontrado. Repetidamente, fica desapontada. Ele não voltará mais. Essa mãe poderá sentir raiva, porque cuidou do filho para que ele vivesse, e não para que morresse. Mas a doença o levou. E ela está desolada. Foi privada do filho amado, roubada. [...] Tentar consolar esta mãe é uma tarefa ingrata: o que mais lhe interessa é a volta do seu filho. E, nesse caso, parece que qualquer consolo é inútil. Mas a mãe, se deixada de lado, poderá isolar-se em sua dor, o que complicará ainda mais a situação.
De conformidade com Worden (1998), uma característica comum encontrada no luto materno é o sentimento de ambivalência. A presença da ambivalência no relacionamento entre mãe e o filho, antes de sua morte, complica o processo de luto, produzindo raiva e culpa na mãe enlutada. O sentimento de culpa, às vezes, é tão intenso que a mãe chega a assumir a responsabilidade pela morte de seu filho.
Na visão de Gibbons (1997 citado por FREITAS, 2000, p. 50):
Tais sentimentos de culpa podem gerar manifestações hostis nas mães. Essa hostilidade pode ser dirigida contra quem tenha sido hostil com o filho. Pode ser dirigida contra o marido, se ele não foi um pai amoroso e tolerante com seu filho. Muitas dessas mães recusam a ajuda terapêutica, dirigindo raiva e hostilidade também contra o terapeuta e contra o próprio tratamento.
A mãe, durante o processo de luto, também pode demonstrar falta de esperança de que a vida possa seguir seu curso. Ela sente-se inquieta, agitada, sem conseguir encontrar um lugar tranqüilo para dar continuidade à sua vida. Ela pode identificar-se com seu filho morto, apresentando sintomas da mesma doença que o levou ao óbito. Costuma exaltar as qualidades do filho falecido, colocando-o numa posição idealizada, acima de todos os outros membros da família. E algumas mães jovens tentam ter outro filho em seguida, para substituir o filho que morreu. Mas, por mais que ela se esforce, é impossível substituir um filho perdido. Cada filho é único, é uma individualidade. Por isso, por mais difícil que seja seu processo de luto, ela precisa elaborar sua perda, para poder retomar sua vida, sabendo, de antemão, que nunca mais será a mesma que tinha antes da perda de seu filho. (FREITAS, 2000)
Pelas considerações acima, fica claro que a morte de um filho é um evento extremamente traumático para a mãe. Ela sente sua dor de forma singular e pode expressá-la por meio de variadas reações. Geralmente, ela é quem mais sofre essa perda dentro do sistema familiar. Em seu luto vivencia um forte sentimento de culpa, pois se sente falha nos cuidados maternos. É difícil para ela desvincular suas falhas do fato que culminou com a morte de seu filho. As reações de luto podem complicar-se, produzindo serias consequências em sua vida pessoal, bem como em seus vínculos conjugal e familiar.

(Parte do texto integrante do estudo para alunos em formação em Terapia Sistêmica familiar do CEFI (Centro de Estudos da Família e do Indivíduo) de Cuiabá, como requisito para a conclusão do 2º ano, sob a orientação da professora Mara Lins em 2008).

2 comentários:

  1. Querida Liane...
    Para nós que freguentamos a tantos anos ás reuniões do grupo ASDl, conhecemos e sabemos muito bem o sofrimento destas mães juntamente com os pais, pois a dor de cada um é unica é a maior de todas,tenho certeza que as tuas escolhas para as postasgens neste blog são de muita ajuda para quem está neste processo de luto tão sofrido, continue querida dando essa forças e mostrando o teu valor e a tua vontade de ajudar essas mãezinhas especíais.
    Bjs te amo

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